Percebemos em nós ou nos outros, carisma, cultura, inteligência para o trabalho e tarefas afins. Admiramos habilidades para as amizades e laços sociais. Mas, quando analisamos os acontecimentos da vida amorosa pregressa, que fatalidade. Há os bem-sucedidos em vários segmentos que tropeçam em escolhas afetivas erradas, mesmo quando desde o início de cada relação percebem estar entrando novamente em escolhas incertas. “A mente desfruta de uma área livre de conflitos”, entretanto, o amor é desencadeado de um núcleo mais complexo e obscuro de onde provêm sentimentos que não escolhemos ou controlamos – vem do inconsciente de nosso Ser. Percebemos, por exemplo, que os objetos de amor, sejam o homem ou a mulher causam no outro intenso e obstinado desejo, mas também são os que mais combinam para contracenar conflitos e desencontros – nós psicanalistas, vemos isso na clínica. Não raro, as pessoas selecionam relações que irão se transformar em confusão ou vazio.
São esses acontecimentos que causam infelicidade, mas são também uma espécie de “caixa preta” que contém os segredos do desastre afetivo. Em vez de só fugir para “relações casuais” e manter casos de “alta liquidez”, é preciso abrir e examinar a “caixa preta” do coração, elucidando as causas dos desencontros e aprendendo com as experiências. Caso contrário, é viver repetindo as mesmas escolhas – a pessoa infeliz, e não analisada, a cada vez desencadeia um padrão inadequado de escolhas, mudando só os personagens da sua história. O que faz com que acabe sempre tendo de contracenar amor e dor. E há os que ainda acham que basta competência, riqueza e de quebra beleza, e o amor lhes cairá do céu.
No entanto, é preciso não se iludir e desenvolver “emoções sábias”, uma mistura de paixão e razão, destinada a intuir escolhas e evitar o fracasso repetitivo nas relações. Mas essa é uma área em que ninguém está livre de enganos e fracassos. Vale dizer: é trágico, se não fosse cômico. Aliás, quando se trata de amor, é sábio guardar uma razoável dose de bom humor, pois a espécie humana é mesmo complicada nessa área.
Devemos nos olhar com suavidade, bom-humor, sem excesso de autopiedade, mas com certo carinho por nossas imperfeições, a fim de deixar a porta aberta para a autocrítica. O que é diferente da condenação cruel e implacável que faz a pessoa se sentir incorrigível, jogando-a para a amargura, e não para a mudança.
Assim como a meta da pulsão é satisfazer-se a meta do amor é encontrar-se. Quando a intuição e/ou experiência não consegue corrigir escolhas: é aconselhável fazer análise, e, investigar, que tipo de paixão nos encontra, para onde nos leva e o que revela sobre nós mesmos? A paixão sem a razão é cega, mas a razão sem a emoção é sinistra: só temos a ganhar com esse equilíbrio.
Mas que ninguém acredite acertar no alvo: o único par amoroso ideal é o par imperfeito. A história de alma gêmea é uma fantástica-fantasia, é certo que, almas foram feitas ao mesmo tempo para o encontro e a discórdia. Só após admitir que seja inviável concretizar sonhos irreais é que estamos mais maduros a conviver e amar alguém real: nosso par imperfeito, singular, consciente que não existe o amor ideal, mas aliado ao desejo recíproco de viver juntos aquilo que é inerente à condição humana – o bom, o mau, o feio e o bonito.
Eduardo Riganelli
Em poucos parágrafos encontramos aqui uma detalhada descrição de mais um dos conflitos que o ser humano padece hoje.
Algo assim como o castigo a que Síssifo foi submetido pelos Deuses do Olimpo, rolar uma enorme pedra ladeira acima para que, quando alcançar o topo ela desça até a base da montanha e ai o ciclo se repita eternamente.
Muito interessante o conceito de “caixa preta” onde estaria guardada a chave para aplacar o sofrimento quando a experiência e a intuição não acudem ao auxílio. Sem deixar de mencionar a necessidade de deixar a porta aberta à autocrítica e de ser mais tolerante com as nossas imperfeições assim como com as de nosso par.
É a primeira matéria que leio neste blog e tenho certeza de que em muitos de vocês, como também em mim, ela deve ter despertado a necessidade de refletir um pouco mais sobre nossos anseios, nossas emoções e essa busca constante do nosso par perfeito.