O AMOR SÓ É ETERNO ENQUANTO SE TEM AMOR

Nietzsche, grande filósofo alemão do século XIX, escreveu que “a maior parte da filosofia foi inventada para acomodar nossos sentimentos às circunstâncias adversas, mas tanto as circunstâncias adversas como nossos pensamentos são efêmeros”, deduzindo, então, que pensamentos e circunstâncias passam, mas os sentimentos não. O amor é um desses sentimentos que devem ser tratados pela filosofia, principalmente porque ele parece transcender a realidade.

Abordaremos neste artigo a seguinte pergunta: o que leva uma pessoa a desamar a outra a qual tanto amou? Geralmente, os primeiros sinais são percebidos com o distanciamento – isso acontece quando o outro começa a sentir o vazio na relação. Na demanda do amor, àquele que desama – começa a dar sinais de distanciamento, ou, a não mais investir na relação.
Há de se indagar: o que ocorre, então, para uma pessoa deixar de amar a outra que amou intensamente? Como duas pessoas que viviam um relacionamento intenso acabam em um relacionamento frio-distante, tornando-se um relacionamento vazio?

A pergunta em foco é uma intrigante resposta, se é que há uma resposta concreta, haja vista o amor do ponto de vista analítico é subjetivo. Mas, não enfocaremos o porquê do amante rejeitado, mas sim, aquele que rejeita.

Neste caso, há várias possibilidades que levam ao fim do relacionamento: frustrações constantes, sentimentos de raiva não verbalizadas, sentimentos de rejeição, desatenção ao parceiro, projetos e planos de vida diferentes, traições, ciúme obsessivo, arrogância, às vezes, por medo de se envolver na relação e se entregar ao outro, e vários outros fatores. É um somatório de fatores que vão acontecendo que levam o amante ao desencanto – e, assim, a relação vai perdendo dia após dia o sentido para o amante que deixa de amar. Dessa maneira, a pessoa passa a ter um olhar de indiferença. O sujeito não sente mais vontade de fazer para o seu amante o que fazia antes – não sente vontade de se cuidar como fazia-o, não sente vontade de fazer os agrados que fazia, definitivamente, deixa de dar a atenção que dava antes, não sente mais vontade de estar com o outro e passa a se incomodar facilmente.

Na psicanálise fala-se em investimento libidinal. Pode-se dizer que o amor apresenta-se em quotas, que faz investimento no próprio ego da pessoa e o investimento de objeto: surgem, então, as explicacões do psicanalista Sigmund Freud, (1856-1939) em que ele fala do “amor egoico” e “amor objetal.”

De repente todos os sentimentos investidos no amante começam a ficar contidos e, assim, a pessoa que rejeita passa a direcionar à sua vida para outros interesses, como, por exemplo, buscar amizades antigas e/ou novas amizades, passar a focar mais no profissional, buscar um novo amante. No entanto, pode acorrer que toda àquela energia que existia entre os dois, passa a ficar retida no ego da pessoa que deixa de amar, havendo uma mudança em toda à sua vida. A pessoa que está passando por esse momento, pode querer sair com amigos não para um novo relacionamento, mas sim, para libertar-se da relação, ou seja, o amante que rejeita pode não querer encontrar um novo parceiro – mesmo que seja temporário.

O fim de um amor, deixa os amantes demasiadamente desgastados: tanto psíquico quanto físico -, mas do outro ponto de vista, as pessoas envolvidas agregam as suas vivências grandes experiências. Digamos que a tempestade emocional na qual os amantes se encontram nessas situações têm objetivos: os preparar para novos recomeços.

E nisso reside o sujeito entender que quando não ama mais o seu parceiro, quando não há mais admiração, é necessário coragem para falar, para não deixar para depois, para pôr fim ao sofrimento do casal. Pode ser um momento crucial, pois o fim de um relacionamento, geralmente, é carregado de dor, mesmo sendo acometido de desamor. Por isso, muitas vezes há pessoas que persistem ficar em um relacionamento que terminou há muito tempo. A pessoa volta atrás e continua o relacionamento – e assim, só vai minando à sua própria vida. Há nesses casos um somatório de argumentos que podem ser usados para protelar a relação, por exemplo: os filhos, são fases do relacionamento, ou ainda, o medo de ficar só.  A pessoa que está insatisfeita com o amante desconstrói todas as suas queixas e insatisfações – passando a se autossabotar e, dessa maneira, começa um processo de autotraição. É como se o sujeito desistisse de focar na sua realidade. Nesse agravo, só há duas opções: a pessoa tem o direito de dar continuidade em seu processo de “autotraição” ou ser leal e comunicar ao outro falando a verdade.

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Mas vale lembrar uma canção de Cartola (Acontece) Cartola foi cantor, poeta e compositor brasileiro Agenor de Oliveira (1908-1980) em que ele canta e fala do amor e do coração que se tornou frio e que não consegue mais dissimular amor. A canção diz:
“Esquece o nosso amor, vê se esquece./ Porque tudo no mundo acontece./ E acontece que eu já não sei mais amar./ Vai chorar, vai sofrer, e você não merece./ Mas isso acontece./ Acontece que o meu coração ficou frio./ E o nosso ninho de amor está vazio./ Se eu ainda pudesse fingir que te amo./ Ah, se eu pudesse./ Mas não quero, não devo fazê-lo./ Isso não acontece”.

Nesta canção podemos entender que por mais que a natureza humana tenha bons motivos para ser moldada de forma que possamos sofrer menos pelo fim do amor que aos poucos vem sendo desconstruido dentro de nós – por razões diversas – e que no início, muitas vezes ainda tentamos protestar para tentar recuperar o amante de nosso afeto, por fim, quando nada disso funciona, é saudável, é leal, que deixemos para trás o amante rejeitado e possamos recomeçar com dignidade e sem culpa.