Os Atos Falhos.

Nunca reprove o ato falho. Ele é o caminho mais seguro ao inconsciente.
Cleber Martins.

Aqueles que conhecem um pouco de Freud, já ouviram falar nos atos falhos, que são, por definição: confessar em um “tropeço” aquilo que percorre o nosso inconsciente, e que muitas vezes tentamos ocultar. A partir do momento que passamos a compreender o real sentido dos atos falhos, podemos observar a maneira como o inconsciente de uma pessoa o trai e confessa suas reais intenções.

Foi a partir da psicanálise, que houve a descoberta dos atos falhos, haja vista até hoje, para aqueles que desconhecem a psicanálise e querem ocultar o real sentido dos supostos erros – os atos falhos eram tidos apenas como simples erros/trocadilhos, um ocorrido “sem querer”, que não tinha maior importância, que não possuíam nenhuma causa e eram atribuídos simplesmente a um “equívoco”. Freud, por sua vez, pôde mostrar no livro “sobre a Psicopatologia Da Vida Cotidiana” que até os erros/tropeços mais comuns teriam um sentido oculto que teria sido ressaltado em determinado erro.

DAS CARACTERÍSTICAS DOS ATOS FALHOS

Os atos falhos consistem em pequenos lapsos – esquecimentos de nomes, horários, datas, coisas a fazer e/ou algo dito que não era o que tinha sido intencionado a dizer – erros ao fazer alguma coisa, ou seja, todo processo em que ocorre alguma interferência no que foi planejado, na atitude “normal” esperada, assim acontecem os atos falhos.

O exemplo a seguir, revela muito sobre os atos falhos: um senhor estava conversando com uma jovem sobre como a cidade estava bonita com os preparativos para o Natal, e disse: “viu a loja tal? Está toda DECOTADA, oh, quis dizer DECORADA!”. Esse é um exemplo bastante simples, mas é intrigante, pois comumente as pessoas têm a tendência a atribuir um erro como esse simplesmente ao acaso, e não procuram investigar o que o ocasionou. O locutor diria “oh, quis dizer DECORADA!” e a coisa ficaria por aí mesmo. A outra pessoa da conversa geralmente tende a não dar atenção ao ato falho. Já Freud interpreta esse pequeno erro como uma interferência de um pensamento inconsciente do senhor a respeito do decote da roupa da jovem senhora. Em todos os casos analisados, Freud consegue mostrar que os atos falhos, dos mais simples aos mais complexos, são frutos de um processo inconsciente suprimido e que sua causa pode ser descoberta.

Outro fator importante – são as investigações policiais – em que um indivíduo precisa depor várias vezes, em um desses depoimentos, o indivíduo pode falar de maneira “inconsciente” e revelar a verdade em um ato falho.

No entanto, pode-se ter em mente que quase todo erro cometido tem um significado oculto. Pode-se dizer quase todo erro cometido, porque às vezes erros são ocasionados pelo alto investimento psíquico em outros acontecimentos. Citaremos outro exemplo: “uma pessoa extremamente preocupada com problemas no trabalho, pode vir a esquecer do amigo, do filho, por exemplo, em determinado local já esperado. Esses acontecimentos são frutos da preocupação exagerada.

Quando alguém busca o psicanalista, às vezes passa horas, dias, meses, anos, tentando explicar o que pensa e o que sente. Discurso controlado, consciente – e que na maioria das vezes oculta a verdade. Se todo efeito tem por trás uma causa, todo “ato humano” tem por trás um motivo, tem um desejo. O que a psicanálise revela é que há muito mais entre nosso inconsciente/consciente do que podemos supor.

Um ato falho, que o analisando deixe escapar em meio às diversas sessões, às vezes dá uma pista mais importante para o psicanalista do que horas e horas de escuta atenta. O ato falho revela o que está reprimido, e pode desencadear o longo e por vezes árduo caminho da cura – embora a busca da cura, não necessariamente – seja a felicidade absoluta, mas a infelicidade suportável.

“Nossos atos falhos são atos que são bem sucedidos, nossas palavras que tropeçam são palavras que confessam. Eles revelam uma verdade por detrás. (…) Se a descoberta de Freud tem um sentido é este – a verdade pega o erro pelo cangote, na equivocação”. (LACAN, 1954/1986, p. 302).